Por que os dados são essenciais aos negócios? Entrevista com Tom Davenport

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O uso de dados e algoritmos para aprimorar negócios não poderia estar mais em evidência. Uma pesquisa global, divulgada recentemente pela consultoria Gartner, lista pelo terceiro ano consecutivo a inteligência artificial como prioridade para CEOs de empresas de portes e indústrias variadas.

O potencial desse setor é traduzido em números expressivos. Segundo a Statista, o mercado global de softwares de IA deverá mais do que dobrar nos próximos anos. A receita, estimada em US$ 51 bilhões em 2022, tende a saltar para US$ 126 bilhões em 2025.

À medida que aumenta o interesse das empresas pelo tema, espera-se também um crescimento exponencial da área de análise de dados. Estimativas apontam para uma alta anual de 30%, o que fará deste um mercado de US$ 68 bilhões em três anos.

Projeções à parte, a adoção de tecnologias avançadas no ambiente empresarial ainda esbarra em questões culturais. Se, por um lado, a economia digital é cada vez mais pujante, por outro uma parte significativa de executivos vê com desconfiança o apoio das máquinas.

“A primeira regra da transformação digital é que a tecnologia muda rapidamente, mas as pessoas nas empresas mudam lentamente”, diz Tom Davenport ao parafrasear um amigo. Davenport é co-fundador do Instituto Internacional de Analytics e reconhecido globalmente por ajudar empresas a promover inovação. Além disso, é palestrante, professor e autor de 17 livros.

Nesta entrevista concedida à Neoway, o especialista norte-americano contextualiza o uso de dados, aborda desafios e oportunidades, compartilha histórias de sucesso e defende uma mentalidade mais orientada a dados. Para ele, em 90% dos casos as estratégias de dados falham devido à resistência das pessoas a mudar. “Não vemos as pessoas tratando os dados como um recurso importante de negócios”, opina.

Confira abaixo a íntegra da entrevista feita com Tom Davenport.

Neoway – O que o Small data e Wide data trazem de novo e como eles irão impactar o mundo dos negócios na sua visão?

Tom Davenport – Eu estava lendo um artigo recentemente em que o autor dizia que “Big Data” soa como um termo antiquado agora. Eu acho que não vemos mais muitas pessoas se referindo ao termo como tal porque Big Data se tornou “data”. 

Big Data nunca foi um termo muito bom porque o tamanho (dos dados) nunca foi o elemento mais importante, então eu fico feliz em ver o termo sendo atualizado. Claramente, muitos dos dados que as organizações estão usando atualmente são grandes em volume, mas há uma necessidade de combinação entre Big Data, Small Data e tudo o que há entre eles.

Small Data são os dados que vêm dos nossos sistemas transacionais. Podem ser dados de clientes, dados de Recursos Humanos, e nós podemos usá-los para fazer previsões eficientes sobre o que os consumidores vão comprar, ou quais colaboradores talvez deixem a empresa. Enfim, são dados sobre o que os consumidores, fornecedores e colaboradores têm gerado em relação à empresa. 

Tudo isso está nas transações de Small Data e é muito útil, principalmente quando podemos combiná-los com Big Data, com informações das mídias sociais e com dados relacionados às pessoas que ainda não são nossos clientes e que nós talvez possamos convertê-las em clientes. Eu acho que todas as organizações precisam olhar para ambos: Big Data e Small Data. E, independentemente da finalidade (Marketing, RH ou cadeia de suprimentos), você tem que pensar que todas essas fontes de dados podem jogar luz no seu ambiente de negócios.

Neoway – Como você vê o movimento de criação de ecossistemas de colaboração em dados nos EUA e no restante do mundo? Seria essa, enfim, a saída para que qualquer empresa consiga, por exemplo, monetizar os seus dados?

Tom Davenport – Os ecossistemas de colaboração de dados estão aparecendo em todos os lugares. Um dos facilitadores é a inteligência artificial e a criação de ecossistemas e plataformas que permitem às companhias conectar seus consumidores a uma variedade de outros consumidores com uma fricção relativamente baixa. 

Nós tivemos o surgimento de companhias de modelos de negócios de plataforma digitais, como Uber, Airbnb e Amazon, e, agora, estamos começando a ver o movimento entre outras grandes companhias também. Por exemplo, a Airbus tem uma colaboração de dados com todas as empresas que voam com suas aeronaves, chamada Skywise. A segunda maior companhia de seguros nos Estados Unidos, Anton Insurance, está formando uma espécie de plataforma digital para conectar pessoas que precisam de seguros de saúde com provedores desse tipo de serviço. 

Então, é a IA que torna isso possível de duas formas: primeiro, porque ela diminui a fricção e permite que você combine o que os consumidores querem e o que está disponível entre os colaboradores. Segundo, porque a integração de dados tem sido um problema complexo, mas a IA está ajudando muito nisso a partir de abordagens probabilísticas, por exemplo, para identificar um cliente que tem 95% de chance de ter o mesmo perfil de outro cliente. Nesse caso, devo cruzar os históricos de uso? Sim. Isso permite integrar os dados com muito menos trabalho.

Neoway – O setor financeiro é um dos que mais investem em análise de dados. Na sua opinião, o que esse contexto irá gerar ao redor do mundo em termos de inovação para o mercado financeiro e mercado de capitais? 

Tom Davenport Este é o setor mais sofisticado em termos de uso e análise de dados. Nós vimos isso acontecer por muito tempo com trading (compra e venda de ativos financeiros), que precisa acontecer muito rapidamente: se você buscar ser bem-sucedido nessa missão, tem que se basear em análise de dados. 

Agora o conceito está se expandindo para outros ramos do setor financeiro, como a gestão de investimentos, a gestão de fortunas e os serviços bancários voltados para o cliente final. Mas, ainda há um longo caminho a percorrer porque existem muitas organizações de serviços financeiros que têm quantidades massivas de dados e não provêm muito valor para seus clientes em termos de oferecer uma vida financeira melhor. Vamos ver um novo leque de ofertas e serviços surgirem para nos ajudar a tomar melhores decisões na vida financeira.

Neoway – Qual é o exato valor da análise de dados dados para o setor financeiro na sua visão?

Dinheiro significa dados na maioria dos casos. Estamos nos movendo pelo mundo na velocidade da luz e não enviamos mais dólares ou reais fisicamente, enviamos informações. 

Mas, eu acho que se quisermos tomar melhores decisões financeiras (seja de investimentos ou trading), temos que usar todos os dados para dizer: ‘ok, baseado em padrões históricos, as pessoas que têm tomado esse tipo de decisão têm ganhado mais dinheiro do que pessoas que tomaram outro tipo de decisão, então essa é a minha recomendação para você.’ 

Acho que essa é uma lacuna porque ainda há decisões tomadas de forma muito ruim. Por exemplo, as pessoas compram ações a preços altos e vendem a preços baixos a todo tempo, especialmente agora em que há o declínio do mercado acionário nos EUA.

Neoway – As tecnologias não param de avançar, mas, um dos grandes desafios das empresas em usar os dados nas tomadas de decisão, é geracional. No Brasil, ainda encontramos resistência, por exemplo, entre os conselheiros de grandes empresas, que preferem não ceder à tecnologia. Qual é o impacto disso para as corporações? 

Tom Davenport – Geralmente é difícil fazer executivos seniores mudarem seu jeito de tomar decisões ou entender o que está acontecendo na organização. Claro que há exceções: eu fiz alguns trabalhos no Brasil com líderes de uma determinada empresa e eles são muito orientados à tomada de decisões baseada em dados. 

Uma das pesquisas que fiz recentemente nos Estados Unidos junto a empresas grandes e sofisticadas indicou que apenas 29% delas tinham uma cultura data driven (orientada por dados). Uma mudança de cultura desse tipo é particularmente lenta. Um dos meus amigos no MIT (Massachusetts Institute of Technology) diz que a primeira regra da transformação digital é que a tecnologia muda rapidamente, mas as pessoas nas empresas mudam lentamente.

Neoway – Quais são as principais conclusões do seu livro The AI Advantage: How to Put the Artificial Intelligence Revolution to Work? (A vantagem da IA: como colocar a revolução da inteligência artificial para trabalhar)?

Tom Davenport – Este livro é sobre a adoção empresarial da IA e o que as companhias podem fazer com ela. Um dos meus primeiros conselhos é: pense grande, comece pequeno. Tenha a visão do que você quer que a IA faça na sua empresa. A IA tende a ser mais orientada por tarefas individuais em relação a processos gerais da empresa, então você talvez tenha que adotar uma série de projetos menores para conseguir ter um impacto maior. 

Eu acho que nós passamos por um período em que a IA era mais experimental, com muitos pilotos e provas de conceito, mas se quisermos tirar valor da tecnologia precisamos da implementação de produtos (que é a fase final de cada projeto). A partir disso, começamos a promover melhorias aos poucos, mas ainda não vejo um número suficiente de empresas colocando seus modelos e algoritmos em produção.

Então, pense grande, comece pequeno, e considere o impacto nas pessoas porque elas podem aceitar ou recusar o uso desses sistemas. Na maioria das vezes, é uma questão mais da relação homem-máquina do que do uso da automação para eliminar postos de trabalho em larga escala.

Neoway – Você escreveu um artigo com o título Getting serious about data and data science (Leve os dados e a ciência de dados a sério). O que você quis dizer com esse recado?

Nós vemos muitas pessoas falando da importância dos dados, que os dados são o novo petróleo, ou que os softwares estão dominando o mundo, etc. Mas, não vemos as pessoas realmente tratando os dados como um recurso importante de negócios. 

Como falamos anteriormente, muitos executivos seniores ainda não estão confortáveis em tomar decisões baseadas em dados e não consideram projetos de larga escala baseados em  analytics e IA. Acho que precisamos de uma transformação cultural de larga escala nesse sentido. 

Eu tenho um amigo que é Chief Data Analytics Officer que atuou em uma empresa de seguros, depois em um banco de grande porte nos EUA, na sequência foi para uma empresa igualmente significativa na indústria de carros e agora está na Meta (ex-Facebook). 

Ele me disse que a grande diferença no atual cargo é que ele não precisa convencer as pessoas de que dados e analytics são importantes porque elas já sabem disso. Ele disse: “eu não preciso ser um evangelista”. Então, é sobre como endereçar as demandas e não como gerar a demanda. Esse tipo de pensamento  nos faz levar os dados e a ciência de dados a sério.

Neoway – Você diria que a resistência ao uso de dados é o principal motivo pelo qual estratégias falham nas empresas?

Eu acho que sim. Eu faço uma pesquisa todos os anos e pergunto às pessoas se elas têm uma cultura data driven, se os dados são considerados um recurso crítico de negócios e etc… 

Muitas delas dizem que não têm esse tipo de mentalidade. Então, eu pergunto o que as impede, e as respostas passam pelo uso de tecnologia e pela insuficiência de pessoas especializadas no desenvolvimento do trabalho. Mas, a resistência cultural da organização aparece como o motivo principal para 90% das pessoas.

Neoway – Diante dessa dificuldade, como desenhar uma estratégia vencedora de IA, que é o tema do seu próximo livro?

No livro, que será lançado no final deste ano, nós falamos sobre organizações que promoveram abordagens agressivas de inteligência artificial e que competem neste tema. Entre os componentes estratégicos, você precisa decidir se vai transformar o seu modelo de negócios; os produtos e serviços; a forma como você vai ao mercado para anunciar lançamentos; se vai transformar as operações em larga escala. 

A Shell é uma das companhias com quem temos falado sobre transformação operacional. Por exemplo, a empresa costumava alocar pessoas para fazerem inspeções físicas em refinarias, um processo que leva cinco ou seis anos para completar todo o planejamento. Agora, eles fazem esse trabalho por meio de drones, com reconhecimento de imagens baseado em modelos de deep learning a partir da IA – ou seja, tudo agora pode ser feito em questão de dias. É um jeito totalmente diferente de fazer operações nesta indústria.

Outra possibilidade está relacionada com a mudança do comportamento dos consumidores. Nos Estados Unidos, estamos começando a ver nas indústrias automotiva e de seguros o surgimento de sistemas em que as pessoas pagam pelos serviços de acordo com o histórico de uso. Do ponto de vista de negócios, não se trata de penalizar pessoas que dirigem de forma imprudente, por exemplo, mas de dar a elas a oportunidade de aprimorar e praticar uma direção mais segura. Como mudamos os consumidores para melhor? No caso da indústria de seguros, as empresas reconhecem os casos de incêndios em carros e casas e pagam o capital segurado combinado, mas o que elas realmente querem é prevenir que esses incidentes aconteçam. Acho que isso acontecerá cada vez mais no uso de analytics e IA.

Neoway – Como você enxerga o futuro dos dados e da IA?

As pessoas ainda tomam muitas decisões ruins, e nós vamos precisar fazer a transição para a tomada de decisões mais automatizadas, com ou sem revisão humana. 

Já existem ferramentas para nos avisar quando os modelos de machine learning não estão fazendo previsões com a mesma eficiência de antes, então precisamos treiná-los novamente. Ou esse treinamento pode ser automatizado, para ter o re-aprendizado contínuo. Nós realmente vamos precisar de todas as pessoas envolvidas nesta revolução, e não apenas os data scientists.
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Por 

Neoway

A Neoway é a maior empresa da América Latina de Big Data Analytics e Inteligência Artificial para negócios. Fundada em 2002, em Florianópolis, lançou a sua plataforma SaaS em 2012, e, hoje, está presente em todo o Brasil.

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